segunda-feira, 13 de julho de 2020

DIFERENÇAS ENTRE O ESPIRITISMO E A UMBANDA


Após a publicação do texto "Diferenças entre a Religião do Candomblé e a Religião de Umbanda" em nosso blog (https://filhosdavovorita.blogspot.com/2011/07/diferencas-entre-religiao-de-umbanda-e.html?fbclid=IwAR0ZnxERZR8wQz0vNRexlBgm4Wf3U-fCgamyerZFHkoLRjvooywGcSUSuF4), damos continuidade ao trabalho doutrinário de definição do que é Umbanda. Neste texto, vamos procurar estabelecer as diferenças e convergências entre a Umbanda e o Espiritismo.

Espiritismo e Umbanda: Aspectos Históricos.

Desde o início do Movimento Umbandista no Brasil, é possível perceber certa confusão e tentativa de aproximação das casas ao termo "espírita". De uma forma ampla, tinha-se, por espírita qualquer pessoa que fosse médium ou que participasse de uma casa onde havia manifestações espirituais, fosse ela "Kardecista", Umbanda ou Candomblé.

Para se ter uma ideia, quando da anunciação da Umbanda pelo Caboclo das 7 Encruzilhadas, através do médium Zélio Fernandino de Moraes, a primeira casa de Umbanda do Brasil recebeu o nome de Tenda ESPÍRITA Nossa Senhora da Piedade. As outras 7 Tendas fundadas sob a ordem do Caboclo para a propagação da Umbanda no Brasil também receberam a denominação Tenda Espírita.

Os primeiros Umbandistas e escritores da religião, tinham que a Umbanda nada mais era do que uma vertente do Espiritismo, denominada "Espiritismo de Umbanda". Essa visão é facilmente constatada na obra "O Espiritismo, a Magia e as 7 Linhas de Umbanda" de Leal de Souza. Ou seja, na época, aceitava-se a ideia de que a Umbanda era uma vertente, uma forma diferenciada de se praticar o espiritismo.

Por essa razão, a primeira Federação de Umbanda do Brasil, fundada em em  26 de agosto de 1939 denominava-se "Federação Espírita de Umbanda (FEU)". Em 22 de junho de 1947 passou a se chamar União Espiritista de Umbanda do Brasil - UEUB, existente até hoje e na qual nossa Tenda é filiada.

Sob a direção da FEU, realizou-se em 1941 o Primeiro Congresso Brasileiro de Espiritismo de Umbanda. As teses apresentadas neste congresso, reafirmam o pensamento da época de que a Umbanda era uma vertente do Espiritismo. 

Inclusive o próprio Tata Tancredo, precursor do Omolokô (corrente que não concordava com o "branqueamento" da Umbanda e o afastamento das tradições africanas da religião), procurando se contrapor à FEU fundou em 1950 a Confederação ESPÍRITA Umbandista do Brasil.

Verifica-se, portanto, que mesmo a corrente religiosa que fazia oposição ao movimento da FEU, não concordando com a aproximação da Umbanda com o Espiritismo, acabou por adotar o termo Espírita em sua instituição.

Uma das vertentes mais importantes da Umbanda, fundada por Benjamin Figueredo em 1942, recebeu o nome de Tenda ESPÍRITA Mirim, vertente essa que se espalhou pelo Brasil e pela Europa e que possui uma ritualística diferenciada dos terreiros da chamada "Umbanda Tradicional". 


No intuito de buscar um diálogo e certa unificação entre as duas vertentes da Umbanda, foi fundado em 1956 o Colegiado ESPÍRITA do Cruzeiro do Sul, com representantes dos dois grupos (UEUB e CEUB), tendo por presidente o próprio Tata Tancredo. Mais uma vez, o termo Espírita se fez presente para designar uma instituição Umbandista.

Contudo, o Segundo e Terceiro Congresso, realizados respectivamente em 1961 e 1965, dessa vez organizado pelo Colegiado, passaram a receber o nome de "Congresso Nacional de Umbanda", não sendo mais adotado a expressão espírita. 

Entretanto, mesmo após a identificação da Umbanda como religião autônoma, os templos permaneceram por um bom tempo, alguns até hoje, utilizando-se da expressão "ESPÍRITA". E, uma  das justificativas para tal utilização, é fugir do preconceito. Isso porque, o Espiritismo é uma religião mais aceita pela sociedade brasileira, inclusive pela mídia. Muitos adeptos se declaram espíritas para não sofrerem preconceito em suas comunidades e ambientes de trabalho.

Na época da perseguição do Governo Vargas, os Terreiros de Umbanda tiveram que organizar um manual, entregue aos chefes de polícia, para identificar quais eram as casas de Espiritismo de Umbanda e quais eram as casas de feitiçaria, no intuito de esclarecer as autoridades e impedir as invasões policiais. Portanto, o uso do termos "espírita", foi - com exceção da corrente que entendia ser de fato uma vertente do espiritismo - empregado com o intuito de proteção da comunidade umbandista da época.

Todavia, como se demonstrará nos próximos tópicos, em que pese a forte influência do Espiritismo na  Umbanda, estas representam religiões diferentes.


Espiritismo

O Espiritismo surgiu em Lyon na França em 18 de abril de 1857. Essa data refere-se à publicação do Livro dos Espíritos pelo professor Hippolyte Léon Denizard Rivail, o qual adotou o nome de Allan Kardec. Por isso, ainda que de forma imprópria, chamam-se os adeptos da doutrina de "Kardecistas".

Allan Kardec foi o responsável pela chamada "Codificação Espírita", composta por 5(cinco) obras básicas: O Livro dos Espíritos; O Livro dos Médiuns, A Gênese, o Céu e o Inferno ou a Justiça Divina e o Evangelho Segundo o Espiritismo, além de outras obras complementares como "O que é o Espiritismo" "Viagem Espírita em 1862" e a "Revista Espírita". Após o seu desencarne em 31 de março de 1869 houve a publicação de mais um livro, chamado "Obras Póstumas".

Tais obras abordam questões religiosas, humanas, formação do universo, Leis Naturais, Leis Morais, Mediunidade entre outras. Todas fruto da comunicação de diversos espíritos, sob a tutela do Espírito da Verdade.


Ao contrário do senso comum, Allan Kardec não era médium. Ele era professor, cientista. Passou a se interessar pelos fenômenos das mesas girantes, moda na Europa, tendo por objetivo desmascará-los. Ao conhecer o fenômeno, chegou a conclusão de que existia uma inteligência oculta por trás daqueles eventos, passando então a realizar inúmeros estudos, experiências e viagens, no intuito de aprofundar o conhecimento. Utilizava-se de diversos médiuns, os quais encontravam-se em lugares muito distantes uns dos outros, obtendo um mesmo padrão de respostas. Para melhor entendimento, recomenda-se aqui, o filme "Kardec", lançado no ano de 2019.

Assim, passou a elaborar um trabalho que consistia no estudo da mediunidade e seus fenômenos, no mundo dos espíritos e sua interação com os encarnados, e os mecanismos para se progredir espiritualmente. Portanto, o Espiritismo é tido como Religião, Ciência e Filosofia.

O Espiritismo chegou ao Brasil por meio de famílias influentes, que em viagem à França, conheceram o trabalho de Kardec e a trouxeram para o Brasil. Os primeiros Centros Espíritas do Brasil tinham os estudos das obras em francês, visto que, até então não havia tradução. Isso gerou o sentimento de uma certa "elitização" do espiritismo no Brasil, visto que apenas as pessoas com cultura e influência na sociedade tinham acesso.

De qualquer sorte, o Espiritismo se popularizou no país e o Brasil ostenta o título de maior nação espírita do Mundo, passando inclusive a França, onde o movimento teve origem. Nomes como Bezerra de Menezes, Batuíra, Eurípedes Barsanulfo, Manoel Philomeno de Miranda, Chico Xavier, entre outros, contribuíram de forma significativa para o fortalecimento e expansão do espiritismo no Brasil.

Em 1884 foi fundada a Federação Espírita Brasileira - FEB, a qual trouxe sustentação e unificação ao Movimento Espírita brasileiro. Através dela, os centros espíritas passaram a receber todo o apoio doutrinário e legal para o funcionamento e aperfeiçoamento dos seus membros.  

Diferenças entre o Espiritismo e a Umbanda

Abordados os aspectos históricos, passa-se agora a fazer uma comparação singela entre a Umbanda e o Espiritismo:

- Espiritismo: Religião que surgiu na França em 18 de abril de 1857, por meio de Allan Kardec.

- Umbanda: Religião que surgiu no Brasil em 15 de novembro de 1908, através do Caboclo das 7 Encruzilhadas e seu médium, Zélio Fernandino de Moraes.

- Espiritismo: Baseia-se exclusivamente nas obras de Allan Kardec, tendo por base 5(cinco) obras: O Evangelho Segundo Espiritismo, O Livro dos Espíritos, O Livro dos Médiuns, O Céu e o Inferno e A Gênese. Tais obras constituem o pilar de toda a doutrina espírita.

- Umbanda: Ao contrário do espiritismo, não possui uma fonte literária exclusiva. Vivemos na atualidade uma expansão da literatura umbandista, porém estamos longe de um consenso doutrinário. Assim, a depender dos terreiros, pode-se utilizar como base os Livros da Codificação Espírita, Obras de autores umbandistas, Obras de autores africanistas, Obras de cunho oriental e ocultista. 

- Espiritismo: Não se utiliza de velas, imagens, flores, águas, pedras, charutos, bebidas, guias, atabaques, etc. Não faz uso de nenhum elemento material em suas reuniões, bastando o pensamento equilibrado e elevado.

- Umbanda: Utiliza-se de ervas, flores, folhas, sementes, velas, águas, pedras, bebidas, charutos, atabaques, guias, etc., por entender que são elementos necessários à manipulação energética e ao trabalho espiritual;

- Espiritismo: Não cultua Orixás, nem entidades específicas. As sessões mediúnicas têm por finalidade o esclarecimento e o encaminhamento de obsessores que se manifestam espontaneamente nas sessões; 

- Umbanda: Cultua Orixás e entidades específicas através de suas Linhas de Trabalho. As sessões mediúnicas têm por finalidade o desenvolvimento mediúnico de seus adeptos e o atendimento aos necessitados.  

- Espiritismo: Conforme orientação da Federação Espírita Brasileira - FEB, antes de uma pessoa participar das sessões mediúnicas, a mesma necessita passar por um curso de formação, que dura em média 5(cinco) anos, onde a mesma partirá do conhecimento básico até o avançado da doutrina espírita. Portanto, no espiritismo, nas sessões públicas ocorrem apenas palestras e passes.  

- Umbanda: Em que pese a iniciativa salutar de algumas casas, no sentido de ofertar cursos doutrinários básicos ao candidato à ingressar na corrente mediúnica, a grande maioria simplesmente recolhe o candidato, sem qualquer pré-requisito. Assim, muitas vezes, a pessoa vem a descobrir o que é umbanda apenas quando já está fazendo parte do corpo mediúnico de um terreiro. Além disso, as sessões públicas são também mediúnicas, onde as entidades do Terreiro atendem e dão passes nos presentes.

- Espiritismo: Não possui sacerdotes. Geralmente, uma equipe formada por pessoas mais antigas na casa comandam os grupos de estudo, porém não possuem qualquer divisa sacerdotal. Existe também uma organização administrativa nos Centros, porém em nada interfere na parte religiosa do mesmo. Também, não possuem ritos como batizados, casamento, fúnebre, etc.

- Umbanda:
Possui sacerdotes, os quais são preparados para o comando do Terreiro. Possui também rituais de batizado, casamento e fúnebres. 


- Espiritismo: Possui um núcleo de cúpula, no sentido de comando do Movimento Espírita, representado pela Federação Espírita Brasileira - FEB. Para serem considerados espíritas, os centros precisam ser filiados à federação, bem como se submeterem a todo o programa doutrinário da mesma.

- Umbanda: Em que pese as inúmeras tentativas de unificação, a Umbanda não possui um núcleo do cúpula. Geralmente, as vertentes se organizam e fundam uma federação para representá-las. Porém, não existe uma Federação habilitada para falar em nome da Umbanda em geral.

Podemos verificar nas comparações acima, que existem inúmeras diferenças entre o Espiritismo e a Umbanda. Em que pese alguns terreiros utilizarem de obras de Allan Kardec para estudo ou ainda, adotarem alguns dos conceitos do Espiritismo, os mesmos não podem ser chamados de Espíritas, visto que praticam uma religião diversa do "Kardecismo".


O Espiritismo e a Umbanda possuem em comum os seguintes aspectos:

- Ambas são religiões reencarnacionistas;

- Ambas acreditam no progresso espiritual;

- Ambas entendem que a caridade é essencial para a transformação do espírito;

- Ambas entendem que a concepção céu e inferno são metáforas e que os espíritos habitam planos em conformidade com sua vibração e evolução;

- Ambas entendem que Jesus foi o maior médium que passou pela Terra, todavia o mesmo não é Deus.

- Ambas entendem existir apenas um Deus;

- Ambas aceitam, estudam e trabalham com a mediunidade (apesar de utilizarem métodos distintos no seu desenvolvimento);

- Ambas aceitam a existência de um mundo espiritual que nos rodeia;

- Ambas buscam a modificação do indivíduo para o bem, com o cultivo das virtudes ensinadas e exemplificadas por Jesus;

Conclusão

Diante de todo o exposto, percebemos que, em que pese a convergência em alguns pontos, o Espiritismo e a Umbanda são religiões autônomas e distintas. Ambas possuem seus fundamentos e princípios que devem ser fielmente observados pelo praticante. 

Assim, o Umbandista deve assumir sua identidade sem esconder-se no escudo "espírita", visto que, em que pese as constantes agressões, a Umbanda já vem ganhando espaço e respeito na sociedade. E só ganhará mais respeito quando os próprios praticantes não sentirem mais medo ou vergonha de se assumir Umbandista.

Seria de suma importância também, que o Movimento Umbandista se espelhasse nos métodos de organização do Movimento Espírita, buscando um diálogo entre as diversas vertentes, a fim de se estabelecer um órgão representativo que falasse em nome da Religião. Infelizmente, a Umbanda sofre com deturpações e abusos por inexistir uma fiscalização séria e competente, que impeça o uso do nome da Umbanda para práticas completamente destoadas dos seus princípios e objetivos.


Os Terreiros também deveriam se espelhar no referido movimento, especialmente na necessidade constante de estudo. Hoje já existem inúmeros terreiros que possuem Cursos Doutrinários para seus adeptos, grupos de estudos, clube do livro, etc. A Umbanda precisa avançar enquanto religião e para isso, é fundamental que os seus adeptos tenham noções básicas e aprofundadas sobre a religião, a fim de que possam contribuir de forma positiva para seu trabalho e expansão.

Axé meus irmãos!


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Autor:  Jefferson L. Grossl
Fontes:

“O Espiritismo, a Magia e as 7 Linhas de Umbanda - Leal de Souza”
"A História da Umbanda no Brasil - Diamantino Fernandes Trindade".
https://pt.wikipedia.org/wiki/Federa%C3%A7%C3%A3o_Esp%C3%ADrita_Brasileira
https://pt.wikipedia.org/wiki/Espiritismo#:~:text=Espiritismo%2C%20doutrina%20esp%C3%ADrita%2C%20kardecismo%20ou,usava%20o%20pseud%C3%B4nimo%20Allan%20Kardec.  

domingo, 5 de julho de 2020

AS 7 LINHAS DA UMBANDA TRADICIONAL - 4ª LINHA - A LINHA DAS MATAS

Este é o quarto de diversos textos onde vamos conhecer a fundo as 7 Linhas de Umbanda da perspectiva tradicional, ou seja, a configuração das 7 Linhas pela perspectiva dos velhos Umbandistas e primeiros estudiosos da religião.

Caso você ainda não tenha lido o texto onde abordamos a Terceira Linha de Umbanda, a Linha do Oriente, você pode ter acesso através desse link aqui: http://filhosdavovorita.blogspot.com/2020/06/as-7-linhas-da-umbanda-tradicional-2.html

Todas as informações trazidas aqui se baseiam nas obras de Leal de Souza, Lourenço Braga, Diamantino Fernandes Trindade, alguns autores Umbandistas contemporâneos e também experiências pessoais.

O propósito desses textos é buscarmos conhecer as raízes da nossa religião, entendendo de onde surgiu cada Linha, quais seus propósitos e especificidades, fazendo uma comparação com o que observamos atualmente nos terreiros.

Esperamos contribuir para o entendimento e esclarecimento dos irmãos de fé!


A Quarta Linha da Umbanda Tradicional - A Linha das Matas


Nosso propósito com esse texto é aprofundar o conhecimento sobre os espíritos e falanges que compõem a quarta linha de Umbanda e também suas funções dentro do ritual.

Como explicamos no primeiro texto, as 7 Linhas de Umbanda são uma forma de organização espiritual adotada nos primeiros terreiros de Umbanda a partir de 1908, onde os espíritos são agrupados em Linhas, Falanges, Legiões e Povos.

Essa estrutura foi baseada nas organizações militares Romanas antigas e foi se construindo e expandindo na medida que novos espíritos foram se aproximando da Umbanda.

Portanto, como uma verdadeira organização de batalha, as 7 Linhas de Umbanda foram estruturadas para que cada falange, legião e povo tenha uma função específica dentro do Ritual de Umbanda e quando agem em conjunto fazem com que o trabalho se desenvolva de forma fluída.

A Linha das Matas ou Linha de Oxossi em especial pode sem dúvida ser considerada uma das raízes principais da Umbanda, justamente por ser umas das forças sustentadoras do ritual.

Isso ocorre pois tanto a mata quantos os seres que nela habitam, são as fontes primordiais da maior parte da energia e do conhecimento que é utilizado no ritual de Umbanda.

A Linha das Matas está presente na Umbanda LITERALMENTE desde o dia de seu nascimento, sendo representada pela figura do Caboclo das 7 Encruzilhadas. Esta linha, através da figura dos Caboclos e sob as bases da pajelança que estes praticam, sempre foi uma das forças orientadoras do ritual e das práticas realizadas na Umbanda.

Essa estrutura mostra de forma clara um dos aspectos mais importantes da Umbanda e que deve ser considerado como a identidade primordial da religião enquanto ela existir: 

Um culto que é GENUINAMENTE Brasileiro e que dá espaço para que os verdadeiros donos dessa terra deem o seu recado.

A Umbanda através dessa Linha dá vazão ao conhecimento daqueles estavam aqui muito antes do homem branco pisar nessas terras. 

Ela permite que aqueles que tiveram sua terra invadida e depredada e sua cultura praticamente erradicada ,tragam a tona toda a sua sabedoria, suas práticas de cura e sua visão mais natural e sustentável da vida.

O Caboclo em si tem a capacidade de nos ensinar muitas das habilidades que mais precisamos nos dias atuais, afinal é uma figura altiva, conhecedora dos mistérios dessa terra e que demonstra na prática, a luta diária pela sobrevivência que todos nós passamos.

O Caboclo representa a capacidade de transformar todo o conhecimento em prática. 

Para sobreviver a cada dia, ele deve conhecer a mata, os hábitos do animais, as fases da Lua, as propriedades das ervas, os seres espirituais que habitam a Macaia, além de saber se orientar por trilhas e pelo posicionamento das estrelas para que possa entrar e sair da mata fechada em segurança.

É um ser que deve levar em consideração todas essas informações de uma maneira sagaz e inteligente para que possa prosperar em meio às dificuldades e vencer a cada dia.

Ele representa aquilo que todos nós devemos ser diariamente para sobrevivermos a nossa vida terrena cotidiana: Verdadeiros caçadores que buscam aquilo que precisam da maneira mais inteligentes e sagaz possível.

É isso, dentre tantas outras coisas, que o Caboclo trás e que faz uma das figuras centrais do nosso culto. E é por isso que a Linha das Matas é uma das, senão a mais importante, linha dentro do culto de Umbanda.

A regência da Linha:


Como já mencionado, toda Linha, Falange, Legião e Povo da Umbanda possui uma regência, ou seja, um Espírito ou Divindade responsável pelo comando e direcionamento daquele grupo de Espíritos.

Na Linha das Matas quem faz essa regência é São Sebastião, Santo Mártir da Igreja Católica que no Brasil é sincretizado com o Orixá Iorubá Oxossi.

Oxossi no Brasil, assim como Iemanjá, sofreu uma grande ressignificação que o popularizou como o Orixá da Caça, da Fartura, Patrono dos Animais, e outros aspectos que acabaram ligando-o às matas e florestas.

Por conta dessa ligação Oxossi é considerado o Patrono de todos os Caboclos e a principal força sustentadora da Linha das Matas.

Entretanto, é interessante observar que quando falamos de “Matas” estamos abraçando um campo muito amplo, que traz em si uma grande biodiversidade de seres físicos e espirituais.

Portanto, devemos reconhecer que muitos seres espirituais habitavam as matas muito antes do cultos aos Orixás e Santos chegarem ao Brasil, e muito desses seres para diversos povos indígenas eram DIVINDADES consideradas “ Deuses donos da Terra”.

Como a Umbanda é uma religião que cultua a ancestralidade, ela reconhece essas divindades que estavam aqui muito antes da religião ser fundada e dá espaço para que se manifestem, mesmo que de forma velada, durante o culto.

É importante ter esse entendimento para observarmos alguns fenômenos que acabam acontecendo dentro da Umbanda, dentre eles o PORQUE A UMBANDA NÃO POSSUI INCORPORAÇÃO DE ORIXÁS (pelo menos não como ocorre no Candomblé por exemplo)

Isso ficará bem claro quando abordamos a Linha de Ogum, entretanto, podemos adiantar que muitas das entidades que incorporam e respondem quando cantamos para os Orixás são na verdade Encantados (Divindades) da terra brasileira que, em razão da similaridade de atuação e energia, se “apropriaram” do nome desses Orixás.

Em resumo, por mais que Oxossi seja considerado a força sustentadora da Linha das Matas, podemos assumir que muitas outras “divindades” ou “encantados” das matas também permeiam e sustentam essa linha.

Algumas dessas divindades brasileiras inclusive dão nome a algumas falanges de Caboclos como conhecemos hoje em dia.

Um exemplo é o Sultão das Matas. Uma divindade que dentro da Encantaria Amazonense é considerado o dono das Matas (Algo muito parecido com o Orixá Oxossi) e que dá nome a toda uma Falange de Caboclos.

Isso nos mostra o quanto a Umbanda sendo puramente brasileira é extremamente rica e não se resume apenas aos Orixás Iorubás, dando espaço para que várias das forças ancestrais das terras brasileiras se manifestem e assumam uma posição (mesmo que velada) dentro do culto.

Quem compõem a linha:


Como podemos imaginar, quase toda a Linha das Matas é compostas por Caboclos, entretanto, vamos definir melhor o que é um Caboclo e o que engloba esse conceito.

Os Caboclos já se manifestavam em diversas outros cultos muito antes do advento da Umbanda em 1908. Cultos como a Macumba Carioca, Cabula, Kimbanda (com K e não com Q), Catimbó, Terecô, Candomblé de Caboclos e diversas Encantarias ao longo desse Brasil já abarcavam essas entidades.

O termo “Caboclo” denota o resultado da miscigenação entre indígenas e brancos, porém tanto na Umbanda quanto em várias outros cultos brasileiros o termo “Caboclo” englobou toda uma gama de espíritos.

Em regiões mais ao norte do país era muito comum inclusive que QUALQUER entidade que se manifestasse fosse chamada de Caboclo, ou seja, os mais antigos chamavam de Caboclo os “Marinheiros”, “Ex-Escravos”, “Encantados” e todas as outras entidades que passaram a ter denominações específicas com o passar do tempo.

Dentro da Linha das Matas temos “Caboclos” que foram em algum momento de sua existência:

Indígenas “puros”, ou seja, não foram miscigenados com os Brancos e em alguns casos não foram nem “civilizados” mantendo-se ligados diretamente a sua cultura indígena.

Indígenas miscigenados, ou seja, filhos de Índios com Brancos que já tiveram maior contato com a cultura europeia cristã aprendendo sua língua e seus costumes.

Caboclos “Encantados”, ou seja, espíritos naturais das matas que nunca passaram por uma encarnação terrena.

Os dois primeiros são os que nós mais conhecemos. Essa entidades geralmente são os que tradicionalmente comandam os terreiros, são “chefes de coroa” e “guias de frente” dos médiuns e que tendem a dar consultas a assistência.

Já o terceiro tipo geralmente trabalha somente no astral durante as giras e se manifestam quando é cantado para o Orixá Oxossi. Não falam, não fumam, não dão consulta e geralmente se manifestam dançando.

Na prática, esses 3 tipos de entidades trabalham de forma conjunta e misturada e é difícil identificá-los. Sua diferença estará na forma de trabalho, sendo uns mais rústicos, calados e práticos e outros mais dados a conversa, doutrinação e geralmente serão os que comandam os terreiros devido a sua facilidade em lidar com as pessoas.

Também vale frisar, que um “quarto tipo” de Caboclo também começou a se manifestar inicialmente na Linha das Matas e com o tempo assumiu um posto de Linha Auxiliar em alguns terreiros:
Os chamados “Caboclos de Couro”, “Caboclos Boiadeiros” ou somente “Boiadeiros” por mais que já se manifestassem em outros cultos tiveram suas primeiras manifestações registradas na Umbanda dentro das giras tradicionais de Caboclos (índios).

Com o passar do tempo, devido ao seu perfil único, trabalho diferenciado e popularidade começaram a compor uma Linha própria, se tornando figuras extremamente presentes na maioria dos terreiros hoje em dia.

Em resumo, de uma maneira geral a Linha da Matas abarca no astral toda uma gama de espíritos que em algum momento tiveram uma certa identificação, familiaridade e lida com as matas.

Isso se desdobra desde espíritos elementais e Encantados até Indígenas e homens e mulheres do Sertão que tiveram em vida uma lida diária com o campo, os animais e as matas conhecendo dessa forma seus meandros, seus habitantes e suas peculiaridades.

Função da Linha:

Como você já deve ter percebido, a configuração das 7 linhas foi organizada de forma que cada uma delas pudesse preparar os médiuns para o trabalho prático de Umbanda.

Na primeira Linha o médium aprende a ter Fé, Convicção, Autoridade Espiritual, aprende a Rezar e a Benzer e também aprende a ter a tão falada Firmeza.

Na segunda Linha o médium aprende a ter Cura e Equilíbrio Emocional e aprende a ser menos afetado emocionalmente pelos ambientes onde passa.

Na terceira Linha o médium aprende a ter força mental, Concentração, Paz de Espírito, Serenidade e outros atributos que o mantenham centrado.

Mas é na quarta Linha que o médium aprende o trabalho pesado de Umbanda que envolve a Incorporação e uso das faculdade mediúnicas para atendimento e cura de terceiros.

Dentro dessa lógica, você consegue perceber que existe todo um caminho que o médium deve percorrer antes de começar a trabalhar incorporado?

E percebendo toda esse caminho, o que você observa nos terreiros de hoje? Os adeptos que adentram a Umbanda se debruçam em conhecer e praticar essa estrutura antes de começar a trabalhar?

Ou simplesmente querem incorporar para logo atender e "dar consulta"?

Hoje vivemos uma Umbanda onde tudo “deve” acontecer rápido!

Onde os médiuns buscam fazer “Cursos de Desenvolvimento Mediúnico” com a intenção de desenvolver a faculdade de incorporação e começar a atender o quantos antes.

Mesmo estando com sua saúde mental e emocional totalmente abalada, essas pessoas querem atender os outros o quanto antes em nome da “Fé, Amor e Caridade”!

O que de fato é uma atitude “honrosa” e de muita boa vontade, entretanto, será que é uma atitude sustentável? Será que essas pessoas estão aptas para atender outras?

Como você pode tratar os males de outra pessoas se você nunca se debruçou em trabalhar os seus?

Será que sem todo esse trabalho prévio você vai conseguir desempenhar um trabalho de qualidade? Será que basta doar o seu corpo e as entidades vão fazer tudo? Qual é a sua responsabilidade em todo esse processo?

São questionamentos que devem ser feitos por todo aquele que quer trabalhar na Umbanda.

E não nos entendam errado, isso não significa que você deve ser um “Santo” ou uma pessoa perfeita para trabalhar na mediunidade.

Apenas significa que você, enquanto médium, não pode doar para os outros aquilo que não tem nem para si!

O trabalho de Umbanda demanda de maturidade e maturidade só se conquista com o TEMPO. Não existe atalho.

E é justamente esse aspecto que o Caboclo trabalha. A maturidade, a responsabilidade e a disciplina que nos faz crescer tanto enquanto pessoa quanto enquanto médium.

A linha das Matas como um todo, é a Linha que comumente orienta o desenvolvimento mediúnico das casas.

Através de todo conhecimento indígena sobre Transe, Xamanismo, Uso de Ervas de Poder, Rituais e Cruzamentos os Caboclos nos orientam em como podemos desenvolver nossas faculdade mediúnicas.

É por isso que os antigos diziam que dentro da Umbanda devemos primeiro “Firmar a Direita” antes de incorporar Exu e Pombagira, afinal ao ter uma boa relação como o Caboclo que nos acompanha poderemos ter um trabalho muito mais firme, disciplinado e concentrado.

Por isso, entendemos que: 

É no pé do Caboclo que está todo conhecimento que vai te permitir desempenhar um trabalho de qualidade na Umbanda! E desconfie de quem tenta te provar o contrário!

As falanges que compõem a Linha das Matas

Agora que já conhecemos a regência, os tipos de espíritos que compõem a Linha e sua função dentro do Ritual de Umbanda, vamos nos debruçar sobre as falanges que a compõem.



A primeira falange - A Falange do Caboclo das 7 Encruzilhadas


A Primeira Falange da Linha de Oxossi é comandada pelo “Chefe”, o anunciador da Umbanda em terras brasileiras, o Caboclo das 7 Encruzilhadas.

Conhecido também pelo nome em que levou em sua última encarnação (Gabriel de Malagrida), o Caboclo das 7 Encruzilhadas foi o espírito anunciador da Umbanda como conhecemos hoje.

Através do médium Zélio Fernandino de Moraes, ele organizou o culto de Umbanda durante todos os anos em que esteve em frente da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, a primeira Tenda de Umbanda. (Para saber mais sobre Zélio Fernandino de Moraes acesse: http://filhosdavovorita.blogspot.com/2009/06/historia-da-umbanda.html).

Esse espírito é tido como uma figura profundamente cristã, tendo relações profundas com Santo Agostinho e a ordem dos Agostinianos como um todo. Inclusive seu ponto riscado trás o símbolo de Santo Agostinho, demonstrando sua forte ligação com esse santo.

Na imagem vemos o ponto riscado do Caboclo das Sete Encruzilhadas na TENSP em 1985.

Na imagem vemos Santo Agostinho com o mesmo coração flechado do ponto do C7E nas mãos.

A Falange do Caboclo das 7 Encruzilhadas é tida como a falange que comanda todas as outras falanges de Umbanda, quase como um quartel general de onde saem todas as regras básicas para que o trabalho possa ocorrer.

São responsáveis pelo acolhimento de todos os espíritos que desejam trabalhar na Umbanda.

Os Caboclos que se manifestam dessa falange geralmente são muito sérios, rígidos, doutrinadores, místicos, de aspecto firme e trabalham muito como imposição de mãos em seus atendimentos.

Geralmente usam o verde e branco em suas guias e trazem arcos e flechas em seus pontos.

Dois Caboclos que comumente (mas não necessariamente) vem desta falange são o Caboclos 7 Flechas e o Caboclo 7 Lagoas, espíritos muito conhecido no meio Umbandista.

A segunda falange - A Falange do Caboclo Urubatão


A segunda falange da Linha das Matas é comandada pelo Caboclo Urubatão (ou Urubatã) da Guia, nome esse que ganhou notoriedade devido a ter um falangeiro que acompanhou o saudoso Pai Rivas Neto durante seus 50 anos de trabalho.

Essa falange também é conhecida como Linha dos Morubixabas, ou seja, dos “Índios mais velhos”.

Dessa falange se manifestam os Caboclos mais velhos de Umbanda, aqueles que estavam aqui encarnados antes mesmo dos portugueses chegarem e que são tidos como os “Guardiões dessa terra”.

Alguns autores afirmam que para a Umbanda ter sido fundada em terras brasileiras foi necessário a outorga desses espíritos, pois eles eram literalmente os ancestrais donos da terra brasilis.

Os espíritos que se manifestam nessa linha são profundamente doutrinadores, líderes natos, trazendo conhecimentos e práticas muito ligadas a sua cultura indígena ao invés de ideais Cristãos ou Espíritas-Kardecistas.

Geralmente esse caboclos trazem em suas guias as cores verde, branco e amarelo e trazem em seus pontos arcos, flechas, penas, lanças e maracás.

Um dos Caboclos que comumente vem dessa falange é o já citado Caboclo Sultão das Matas.

A terceira falange - A Falange do Caboclo Araribóia

A terceira falange é comandada pelo Caboclo Araribóia, figura mítica conhecida por ter sido chefe da Tribo Temiminó e ter liderado a retomada da Baia de Guanabara ao lado dos Portugueses.

Inimigo ferrenho dos Tamoios que estavam aliados aos Franceses e detinham controle sobre aquele território, Araribóia retomou o controle da Baía por volta de 1567 e “fundou” a cidade de Niterói (lugar onde coincidentemente ou não a Umbanda foi fundada).

Até hoje é considerado o guardião dessa terra, tendo inclusive uma estátua em sua homenagem que “vigia” a Baia de Guanabara de possíveis invasores.



Também foi este Caboclo que inspirou José de Alencar a criar a famosa obra “O Guaraní”.

Os espíritos que se manifestam da falange de Araribóia são muito aguerridos e prezam pela seriedade no trabalho e seus trabalhos são muito focados na Quebra de Demandas.

São Caboclos que tendem a ter domínio sobre a força das águas e são grandes conhecedores das propriedades medicinais das ervas, tanto para curar quanto para combater processos de envenenamento.

Geralmente usam em suas guias cores como verde, branco e vermelho e trazem em seus pontos arcos, flechas, lanças, tacapes e outras ferramentas de guerra.

A quarta falange - A Falange dos Tamóios


A quarta falange, a dos Tamoios é comandada pelo Caboclo Grajaúna.

Tamoio significa literalmente “avô” e indica os índios Tupis que primeiro se instalaram no litoral. Possivelmente foram eles que deram origem a diversos outros povos indígenas como os Tupinambás e Tupiniquins por exemplo.

O termo “Tamoios” ficou conhecidos por designar uma junção de líderes indígenas dessa etnia que apoiaram os franceses contra os colonizadores portugueses durante o período de invasão das terras brasileiras pelos europeus.

Dessa falange se manifestam espíritos de diversas etnias e grupos indígenas. São também muito aguerridos e dados a feitiçaria (lembrando que feiticeira não é algo negativo, são simplesmente práticas mágicas que podem ser usadas tanto para curar, quanto para fortalecer um indivíduo por exemplo).

Os Caboclos desta falange são tidos como os organizadores e líderes dos terreiros, aqueles que comandam os trabalhos.

Dois Caboclos muito conhecidos desta falange são o Caboclo Tupinambá e o Caboclo Aimoré.

A quinta falange - A Falange dos Guaranis


A Falange dos Guaranis é chefiada pelo Caboclo Araúna, entidade muito popular no culto Umbandista.

A Nação Guarani, ficou conhecida por constituir lado a lado com os Jesuítas os chamados 7 Povos das Missões, que eram reduções (espécie de vilas) onde viviam em comunhão com os padres, aprendendo a ler, praticando agricultura, artesanato e sendo catequizados nos moldes cristãos.

Devido a esses Carijós (como eram chamados) serem indígenas “civilizados” e “catequizados” eram chamados pelos portugueses de “Os índios mais gentis da costa”, e inclusive alguns deles tinham o costume de se vestir igual os portugueses colonizadores.

Nessas reduções viviam mais de 30 mil Guaranis, até que durante a Guerra Guaranítica em 1755, os 7 Povos das Missões foram destruídos e seus territórios tomados pelas coroas Portuguesa e Espanhola.

Os Guaranis durante essa guerra foram liderados pelo notório Sepé Tiaraju, índio que até hoje é cultuado como santo em algumas regiões do Rio Grande do Sul.


Estátua de Sepé Tiaraju
Da falange dos Guaranis se manifestam a maior parte dos Caboclos que vemos hoje na Umbanda.

Essas entidades tendem a iniciar o desenvolvimento mediúnico dos adeptos e,logo após, se afastam para que o Caboclo que acompanhará aquele médium (caboclo de trabalho) se aproxime e trabalhe. 

Esse é um fenômeno muito comum na Umbanda, devido ao fato de que essas entidades têm a capacidade de literalmente adaptar o campo mediúnico das pessoas ao processo de incorporação.

Os Caboclos desta falange são exímios rezadores, magistas e curiosamente trabalham fortemente com alguns aspectos de vidência.

Algumas dessas entidades trazem uma carga Cristã fortíssima em suas palavras e aconselhamentos, sendo profundamente compreensivos e gentis tanto com os consulentes quanto com os médiuns que acompanham.

A Sexta falange - A Falange dos Peles Vermelhas




A sexta falange é comandada por uma entidade conhecida como Caboclo Águia Branca.

Essa entidade é muito cultuada no México, EUA e Canadá, tendo inclusive centros espirituais dedicados a ele em toda a América do Norte.

A falange dos Peles Vermelhas congrega todos os Caboclos que em vida foram indígenas da América do Norte.

As entidades desta falange são muito ligados ao Xamanismo e as práticas xamânicas em geral, trazendo inclusive nomes Totêmicos com referências a animais, astros e ervas como por exemplo Caboclo Águia Dourada, Cabocla do Sol Nascente, Cabocla das Flores, dentre outros.

São espíritos que trabalham usando a medicina dos animais para suas curas. Para eles o “espírito” da Aranha, da Coruja, do Cavalo é uma energia pode ser manipulada para trabalhar certos aspectos do inconsciente das pessoas e consequentemente trazer cura emocional e física.

Costumam usar em seus trabalhos Machadinhas, Ponteiras feitas de ferro ou ossos de animais e também costumam trabalhar sentados ao contrário dos demais Caboclos que tendem a ser bem ativos e andar pelo terreiro.

Curiosamente as imagens de gesso dos Caboclos dessa falange geralmente são representados com um pato em suas mãos, animal que dentro da iconografia representa a Imortalidade.

A sétima falange - A Falange da Cabocla Jurema


A última falange é a Falange da Cabocla Jurema que é comandada por uma entidade de mesmo nome.

A Cabocla Jurema, apesar trazer em seu nome o termo “Caboclo” é considerada dentro das Encantarias uma “Encantada da Mata”

Suas imagens de gesso inclusive trazem uma onça-pintada aos seus pés que chamada Iauara “O espírito feminino das matas” que junto com Pai Jibóia “O espírito masculino das matas” representam a energia máxima de todas as matas, campos e florestas do Brasil.

É importante salientar que nem toda entidade que se apresenta como “Cabocla Jurema” é um espírito Encantado, estamos apenas frisando que a entidade que deu nome a essa falange foi um espírito Encantado nativo das matas Brasileiras.
Da falange da Cabocla Jurema, se apresentam Caboclos e Caboclas muito ligados as encantarias e matas brasileiras, ou seja, espíritos profundamente “rústicos” e “não civilizados” aos modos que estamos acostumados.

Nessa falange trabalham NO ASTRAL diversos encantados das matas que dentro do Folclore Brasileiro adotaram nomes como Sacis, Curupiras, Caiporas e etc. mas que dentro das encantarias são chamados de “Os Capangueiros da Jurema”.

Esses espíritos não incorporam mas realizam diversos trabalhos no mundo espiritual a serviço dos Caboclos. É tido que os assobios que os Caboclos dão quando incorporados é uma forma de conduzirem e orientarem esses encantados para o trabalho que está sendo realizado.

As entidades dessa falange trabalham muito fortemente com a cura através das ervas e rituais sagrados e geralmente em suas imagens de gesso são representados ao lado de cobras e onças.

É dito que no astral a colônia onde vivem todos os Caboclos de Umbanda é chamado Cidade da Jurema, sendo cantados inclusive alguns pontos quando os Caboclos são evocados e que fazem alusão a essa colônia.

“Vou abrir minha Jurema, vou abrir meu Juremá
Vou abrir minha Jurema, vou abrir meu Juremá

Com a licença da minha mãe Oxum e nosso Pai Oxalá
Com a licença da minha mãe Oxum e nosso Pai Oxalá”

"Eu tive um sonho, lá nas matas da Jurema,
Nunca vi tanta beleza, Cidade do Juremá!
E a Jurema, é uma Cabocla de Pena, 
É rainha da beleza, filha de Tupinambá!

Jurema, Jurema Juremê!
Jurema, Jurema, Juremá!
É rainha da beleza, filha de Tupinambá!"

"Caboclo vai embora, pra Cidade da Jurema,
Oxalá está lhe chamando, na Cidade da Jurema,
Ele vai ser cororado, na Cidade da Jurema,
Com a coroa de aiei, na Cidade da Jurema." 

Trabalho prático da Linha:

O trabalho com a Linha das Matas é o trabalho prático de Umbanda que vemos diariamente nos terreiros.

Essas entidades geralmente incorporam para dar passes e aconselhamentos, fazer rituais de Cruzamentos e Amacis, conduzir as giras de desenvolvimento mediúnico e também praticar rituais típicos da Pajelança como, por exemplo, bate-folhas e fumaçadas com tabaco.

Os Caboclos podem ser evocados para diversos trabalhos, entretanto, se você é um médium iniciante sugerimos que evoque-os para eles te orientarem no seu desenvolvimento mediúnico.

Esses espíritos costumam ensinar banhos e técnicas para facilitar o transe mediúnico além de transmitirem um visão muito sustentável, equilibrada e madura da vida.

Ter uma relação próxima com o Caboclo que te acompanha é garantia que você nunca estará desamparado na sua caminhada!

Por fim, é importante salientar que quando falamos de Caboclo, estamos falando dos povos indígenas desse Brasil e, dentro desse contexto, citamos alguns dados para compreender melhor a questão:

- Antes da chegada de Colombo nas Américas, existiam 50 milhões de nativos habitando essas terras. 

- Apenas 100 anos depois, por volta de 1600, existiam apenas 10 milhões de nativos na mesma porção territorial, ou seja, foram 40 MILHÕES DE NATIVOS MORTOS em apenas 100 anos por conta da invasão portuguesa.

- Em média, durante o período colonial, o Brasil exterminou 1 milhão de índios a cada 100 anos.

- Apenas uma das maiores Bandeiras (Expedições) de Raposo Tavares, foi capaz de aprisionar durante os anos de 1628 a 1630 nada menos do que 60 mil índios. 

- Estima-se que entre 1627 e 1640 os bandeirantes escravizaram cerca de 100 mil indígenas, uma das operações escravistas mais predatórias da história moderna.

Olhando dessa perspectiva é importante salientarmos que a Linha das Matas nada mais é que uma oportunidade que a Umbanda nos dá de resgatar a cultura e a magia desses povos que vem sendo exterminados a 500 anos.

Portanto, não é aceitável a visão de alguns umbandistas de que a figura do Caboclo é tão somente um arquétipo, e que na verdade, na roupagem do caboclo se manifesta um doutor europeu branco. 

Ora, sabemos que a reencarnação oportuniza ao espírito a experiência carnal em diversas culturas, continentes e até gêneros. Todavia, ao simplificar a questão apenas com a figura do arquétipo, estamos, de forma velada, sendo preconceituosos e afastando da Umbanda todo o conhecimento, sabedoria e religiosidade dos indígenas.

Por que a relutância em afirmar que sim, existe um indígena ao seu lado?

Um indígena que talvez não siga a moral e os bons costumes dos "homens brancos"…

Um indígena que talvez não se utilize das práticas tidas como “evoluídas” por alguns círculos da espiritualidade (como o uso de folhas, fumo, bebidas, banhos, etc.).

Mas um indígena que acima de tudo é um ancestral direto seu, que era dono dessas terras antes de qualquer branco pisar aqui e que tem muito a te ensinar se você mantiver sua cabeça aberta para aprender.

Vale lembrar que a Umbanda já nasceu de um rompimento direto com o Kardecismo, justamente por esses círculos julgarem os índios e pretos atrasados e que, portanto, não eram dignos de deixarem suas mensagens.

Sabendo que a Umbanda nasceu nesse contexto, faz sentido entender que o Caboclo é tão somente um "arquétipo" e desprezar toda a cultura, conhecimento e religiosidade desse povo, por mero preconceito?

Questione-se!

Será que quando falamos que o Caboclo é um doutor branco, não estamos apenas justificando o trabalho com um índio, para ser aceito pelas demais escolas espiritualistas? Uma tentativa de branqueamento das manifestações na Umbanda?

Fazer esses questionamentos é fundamental para que possamos amadurecer e crescer tanto como seres humanos, cidadãos e Umbandistas! 

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Autor: Lucas Martins
Revisão: Jefferson L. Grossl

Fontes:

“O Espiritismo, a Magia e as 7 Linhas de Umbanda - Leal de Souza”
“O Ritual do Rosário das Santas Almas Bendita - Pai Juruá”
“Trabalhos de Umbanda ou Magia Prática - Lourenço Braga”
“As 7 Linhas de Umbanda - Histórico e Evolução - Douglas Rainho”
“Organograma Umbandista - Linha, Falanges e Legiões - Douglas Rainho”
“As 7 Linhas de Umbanda - Falanges e Entidades - Carlos Zeferino’
"A História da Umbanda no Brasil - Diamantino Fernandes Trindade".
"Escravidão, Volume I - Laurentino Gomes".

T.U. Filhos da Vovó Rita

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